Rompimento de barragem em Brumadinho: Saiba como tudo aconteceu
- Iasmim Santos
- 8 de fev. de 2019
- 10 min de leitura
Atualizado: 16 de abr. de 2019
No 81° dia de buscas seguem desaparecidas 48 pessoas; Já foram confirmadas 229 mortes.

A barragem da vale se rompeu, na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, na tarde de sexta-feira 25/01. Os rejeitos da barragem atingiram casas, invadiram fazendas, desolou famílias e, desestruturou ecossistemas e biomas locais.
A barragem (I) se rompeu no dia 25 de janeiro na tarde de uma sexta-feira, em Brumadinho, município brasileiro no estado de Minas Gerais. Quando essa barragem se rompeu se esvaiu junto com ela, uma grande onda de lama e rejeitos.
Do verde encantador de uma natureza presente em Minas Gerais, para um marrom, empoeirado e triste da devastação de um ecossistema destruído por um rio de lama e sem vida que passou a correr pela cidade.
De acordo com a Defesa Civil, subiu para 229 o número de mortos identificados devido ao rompimento da barragem, outras 48 pessoas continuam desaparecidas.
As Buscas
Na cidade, as buscas seguem pelo 15º dia. Em coletiva de imprensa, o porta-voz do Corpo de Bombeiros, tenente Pedro Aihara, disse que cerca de 400 militares de Minas e de outros estados estão empenhados na operação e não há previsão para redução do efetivo.
Ainda de acordo com Aihra, houve aumento no uso de máquinas pesadas nas buscas.
“Estamos com 28 máquinas pesadas auxiliando o trabalho de revolvimento da lama para que a gente consiga acelerar esse trabalho”, afirmou.
Segundo Aihara, o número de corpos encontrados permanece o mesmo da última atualização da corporação. Ele explicou que, neste momento, o trabalho se caracteriza pela demanda de acesso a estratos mais profundos da terra.
“É necessário todo esse trabalho de estabilização, de escoramento dessas estruturas. E continuamos com a questão do cruzamento de dados para que a gente consiga fazer as buscas em áreas cada vez mais precisas”, disse.
Atualmente, os bombeiros fazem buscas em cerca de 45 pontos, sendo o ITM, os vestiários e o entorno do estacionamento as áreas de maior concentração das equipes.
O rompimento ocorreu no início da tarde de sexta-feira, na Mina Feijão (faz parte do Complexo de Paraopeba que possui 13 estruturas utilizadas para disposição de rejeitos, retenção de sedimentos, regulação de vazão e captação de água.). A Vale informou sobre o acidente à Secretaria do Estado de Meio-Ambiente às 13h37. Os rejeitos atingiram a área administrativa da companhia, inclusive um refeitório, e parte da comunidade da Vila Ferteco.
No cadastro nacional da Agência Nacional de Mineração, a barragem do Córrego do Feijão é classificada como uma estrutura de pequeno porte com baixo risco e alto dano potencial. A lei 12.334/10 explica que o risco é calculado "em função das características técnicas, do estado de conservação do empreendimento e do atendimento ao Plano de Segurança da Barragem". Já o dano potencial se refere ao "potencial de perdas de vidas humanas e dos impactos econômicos, sociais e ambientais decorrentes da ruptura da barragem".
Em nota, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável informa que o empreendimento e a barragem em Brumadinho estão devidamente licenciados.
Em dezembro de 2018, a Vale obteve licença para o reaproveitamento dos rejeitos dispostos na barragem e encerramento de atividades.
"A barragem não recebia rejeitos desde 2014 e tinha estabilidade garantida pelo auditor, conforme laudo elaborado em agosto de 2018. As causas e responsabilidades pelo ocorrido serão apuradas pelo governo de Minas."
A Vale disse ainda que a barragem possuía Declarações de Condição de Estabilidade emitidas pela empresa TUV SUD do Brasil em junho e setembro de 2018.
"A barragem possuía Fator de Segurança de acordo com as boas práticas mundiais e acima da referência da Norma Brasileira. Ambas as declarações de estabilidade mencionadas atestam a segurança física e hidráulica da barragem."
Segundo a companhia, a barragem passava por inspeções de campo quinzenais. "Todas estas inspeções não detectaram nenhuma alteração no estado de conservação da estrutura."
Por que se rompeu?
A mineradora, usava uma tecnologia de construção bastante comum nos projetos de mineração iniciados nas últimas décadas, mas considerada por especialistas uma opção menos segura e mais propensa a acidentes.
O método chamado de alteamento a montante, utilizado tanto no reservatório I da Mina Córrego do Feijão da Vale como na barragem de Fundão da Samarco, em Mariana, que rompeu em 2015, permite que o dique inicial seja ampliado para cima quando a barragem fica cheia, utilizando o próprio rejeito do processo de beneficiamento do minério como fundação da barreira de contenção.
Nesta terça (29/01), a Vale anunciou que vai eliminar as 10 barragens construídas com esse modelo que ainda mantém no Brasil, todas já desativadas e localizadas em MG. O presidente da empresa, Fabio Schvartsman, afirmou que a decisão exigirá suspender a produção nas minas que ficam perto dessas barragens.
No sistema de alteamento a montante, a barragem vai sendo elevada na forma de degraus conforme vai aumentando o volume dos rejeitos. A lama que é dispensada é formada basicamente por ferro, sílica e água. É o método mais simples e também o mais barato.

É o menos seguro... (...) Uma estrutura que embute um risco não deveria nem ser cogitada", afirma Carlos Barreira Martinez, pesquisador da UFMG e especialista em engenharia hidráulica.
Ele explica que o modelo é o menos seguro porque a barragem é construída em cima de rejeitos que já foram depositados.
"Estamos utilizando uma técnica de depósito de rejeitos que embute um certo risco, principalmente quando há uma elevação muito rápida das barragens."
"Temos um passivo de 50 anos de construção de barragens deste tipo. A velocidade de exploração mineral aumentou muito no Brasil, faz parte da pauta de explorações do país, e temos sido lenientes com o que está acontecendo do ponto de vista ambiental", diz o pesquisador.
A vale é uma das maiores empresas de mineração do mundo e também a maior produtora de minério de ferro, de pelotas e de níquel.
Cabe-se observar que para a produção desses elementos é necessário o uso de mecanismos especializados para a extração, coleta, despejo e armazenamento dos recursos e, elementos utilizados durante todo o processo de produção, inclusive os elementos que não são apropriados para a reutilização, a exemplo dos rejeitos. Exigindo-se assim, comprometimento, respeito e segurança para todos os envolvidos nesse processo produtivo.
Fernando Cesar Ribeiro, professor de engenharia da FEI, especialista em monitoramentos de estruturas, diz que uma barragem, antes de se romper, sempre dá sinais:
“Sinais que não estavam sendo percebidos. Eventualmente, por conta da falta de um monitoramento adequado, nenhuma atitude pode ser tomada, nenhum alerta emitido. Alguns sinais sempre são colocados. Os projetos devem ter esse tipo de cuidado”.
Os investigadores apuram se obras na barragem, detonações de rocha na região ou o acúmulo do volume do lençol freático podem ter contribuído para o rompimento da estrutura. A apuração quer também identificar se nascentes a montante da barragem que se rompeu estariam lançando muita água para o interior dela, a partir do topo.
Por que não se ouviu nenhum alerta na área?
Mesmo que se decida pelo fechamento de uma barragem ou outra estrutura de contenção próximas a comunidades, isso pode levar alguns anos para acontecer. O processo técnico de descomissionamento - termo técnico usado para designar a desativação completa de uma barragem, com a transformação dela em morro - é demorado.
Portanto, após a tragédia de Mariana, a preocupação imediata foi rever os procedimentos de alerta em caso de rompimento. Não havia qualquer sistema de sirenes nas barragens da Samarco que romperam em 2015.
Na época, os próprios moradores tiveram que alertar uns aos outros ao perceberem que uma tragédia estava prestes a ocorrer. Mas 19 pessoas não tiveram tempo de se salvar.
Após a tragédia, foi aprovada uma lei que exige a instalação de sistema de alerta por sirenes nas barragens. No caso de Brumadinho, elas foram instaladas nas comunidades próximas à barragem. Mas os moradores dizem que as sirenes não tocaram.
A lama pegou centenas de pessoas de surpresa, na hora do almoço. Quem sobreviveu teve poucos minutos para escapar.
Em nota à BBC News Brasil, a Vale disse que o sistema não funcionou por causa da 'velocidade' do deslizamento.
Mas especialistas disseram que a explicação não convence, já que, segundo eles, existe tecnologia para que alertas sonoros de emergência sejam acionados em qualquer circunstância, independentemente da velocidade do evento.
"Falar que a sirene não tocou porque o evento foi muito rápido é brincadeira", critica Sergio Medici de Eston, professor de Engenharia de Minas da Universidade de São Paulo (USP).
Cabe destacar também:
Outra questão que ficou clara após a tragédia de Mariana são as graves consequências da ausência de um plano de contingência e evacuação.
A legislação já exigia a elaboração de um plano de emergência para cada barragem. Mas o da barragem de Fundão, em Mariana (MG), por exemplo, não continha sequer uma estratégia para alertar diretamente os moradores de Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana que ficava na rota da lama.
Portaria do Departamento Nacional de Produção Mineral estabelece que cabe à empresa que administra as minas alertar e garantir rotas de evacuação para a população na região abaixo da barragem, já que não haveria tempo para uma intervenção das autoridades.
Consequências sentidas com o tempo
A quantidade de mortes e desaparecidos pode trazer impactos à saúde mental das pessoas atingidas direta e indiretamente, alertam especialistas ouvidos pelo site UOL. Eles se baseiam em estudos e trabalhos realizados em comunidades que experimentaram acidentes como o do dia 25. Um deles foi feito em 2017 pelo Núcleo de Pesquisa em Vulnerabilidade e Saúde da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) com 271 vítimas do rompimento da barragem do Fundão em Mariana. Dois anos após o acidente, 28,9% das vítimas apresentavam depressão (incidência 3,5 vezes superior à esperada na população em geral), 32% tinham TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada) três vezes maior, e 12%, TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) - em crianças, a porcentagem chegou a 83%
Segundo a pesquisa, a morosidade na reparação das perdas e a falta de acompanhamento social e psicológico adequado estão entre os principais fatores para o adoecimento das pessoas afetadas.
Uma análise feita pela Fundação "SOS Mata Atlântica" na tarde desta quinta-feira (7/02) confirmou a presença de rejeitos de lama no trecho do Rio Paraopeba que corta a cidade de Maravilhas, a cerca de 130 km de Brumadinho, onde a Barragem 1 da Mina Córrego do Feijão se rompeu no dia 25 de janeiro.
De acordo com a coordenadora de águas da Fundação, Malu Ribeiro, apesar da confirmação da presença de rejeitos no local, a análise apontou uma pequena melhora em relação a que foi feita em Pará de Minas, onde o rio foi dado como morto.
Apesar da melhora apontada por Malu, a situação do rio preocupa a população ribeirinha de Maravilhas. O agronegócio representa 60% da economia do município, que tem cerca de oito mil habitantes.
De acordo com o prefeito da cidade, Diovani Policarpo (PV), a Prefeitura não tem recursos em caixa para ajudar os produtores.
“Hoje, na situação que está o município, na situação caótica que está, não temos condições [de ajuda-los]. Até os afluentes foram atingidos”, revelou.
Quer saber um pouco mais? Atente-se a essas informações
O volume de rejeitos vazados foi menor do que a tragédia de Mariana. Segundo o presidente da Vale, vazaram 12 milhões de metros cúbicos. Em Mariana, há 3 anos, foram 43,7 milhões de metros cúbicos;
Ao menos seis prefeituras emitiram alerta para que população se mantenha longe do leito do Rio Paraopeba, pois o nível pode subir. Às 15h50 de sexta, os rejeitos atingiram o rio;
A Vale teve R$ 12,6 bilhões bloqueados para o pagamento de indenizações trabalhistas, multas e outros custos por causa do rompimento da barragem;
A Vale anunciou doação de R$ 100 mil a cada uma das famílias das vítimas;
A Vale informou que o rompimento ocorreu na barragem 1 da Mina Feijão - que causou o transbordamento de outra barragem, segundo o presidente da empresa, Fábio Schvartsman;
O Ministério do Meio Ambiente, por sua vez, informou que foram 3 barragens rompidas;
As Barragens:
A estrutura da barragem 1, utilizada para disposição de rejeitos, foi construída em 1976 e tem volume de 12 milhões de metros cúbicos;
Já a barragem 6 é usada para recirculação de água e contenção de rejeitos em eventos de emergência. Foi construída em 1998, e tem cerca de 1 milhão de metros cúbicos;
Com o rompimento da barragem 1 na sexta-feira (25), a barragem 6 transbordou. A Vale monitora a situação da estrutura, contudo emitiu alerta para que moradores da região deixem suas casas preventivamente na madrugada de domingo (27/01).
A Barragem Menezes II, também na região, tem um volume de aproximadamente 290 mil metros cúbicos e é utilizada para a contenção de sedimentos e clarificação do efluente final;
Quase todas as barragens da Vale no Córrego do Feijão eram consideradas de baixo risco, mas de dano potencial alto. A informação é do Cadastro Nacional de Barragens da Agência Nacional de Mineração;
Justiça?
A Polícia Federal (PF) informou no sábado (26/01) que abriu um inquérito para apurar crime ambiental e contra a vida após rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
O rompimento da barragem foi no início da tarde de sexta.
De acordo com a PF, o procedimento tem o objetivo de investigar a autoria e a materialidade do crime e recolher documentos, fazer interrogatórios e eventuais buscas. A corporação informou que o inquérito tem 30 dias para ser concluído.
A Polícia Civil de Minas Gerais também informou neste sábado que instaurou um inquérito. Segundo a corporação, o responsável pelo procedimento é o delegado Luiz Otávio, da Delegacia de Meio Ambiente.
De acordo com a Polícia Civil, o delegado vai apurar tanto o dano ao meio ambiente como as vítimas da tragédia.
Ministério Público
A PGR (Procuradoria-Geral da República) criou uma força-tarefa de nove procuradores, com duração inicial de seis meses, para investigar as causas da tragédia em Brumadinho. O MP-MG (Ministério Público de Minas Gerais) já abriu quatro inquéritos civis e um procedimento de investigação criminal sobre o rompimento da barragem. O MPT (Ministério Público do Trabalho) também apura responsabilidades relativas à lei trabalhista e conseguiu, na Justiça, o bloqueio de R$ 1,6 bilhão da Vale para garantir o pagamento de indenizações.
No senado
Foi protocolado nesta quinta-feira (7/02) o requerimento de criação da CPI de Brumadinho, que vai investigar a situação das barragens do país.
Os deputados federais Joice Hasselmann (PSL-SP), Carlos Sampaio (PSDB-SP) e Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) apresentaram pedido de criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar as causas do rompimento da barragem. Um pedido de abertura de CPI também foi feito pelos senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Carlos Viana (PSD-MG). Na ALMG (Assembleia Legislativa de Minas Gerais), pedidos de CPI foram protocolados pelos deputados Beatriz Cerqueira (PT), Sargento Rodrigues (PTB) e Doutor Wilson Batista (PSD).
O presidente da Casa, Agostinho Patrus (PV), disse na sexta (1/02) que um projeto proibindo a construção de barragens como a de Brumadinho terá prioridade na tramitação
TCU
O TCU (Tribunal de Contas da União) abriu processo para acompanhar as providências tomadas pela ANM (Agência Nacional de Mineração) para apurar as causas e as responsabilidades pela tragédia em Brumadinho.
CVM
Órgão responsável por fiscalizar o mercado financeiro, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) abriu procedimento administrativo para investigar como a Vale comunicou o mercado sobre o rompimento da barragem.
Referências:
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47002609
https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/01/28/entenda-como-funciona-a-barragem-da-vale-que-se-rompeu-em-brumadinho.ghtml
https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/01/25/veja-o-que-se-sabe-ate-agora-sobre-o-rompimento-da-barragem-da-vale-em-brumadinho.ghtml
https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/02/08/brumadinho-numero-de-vitimas-identificadas-sobe-para-151.ghtml
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2019/02/04/numero-oficial-de-mortos-no-rompimento-da-barragem-em-brumadinho-e-de-134.ghtml
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47077083
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/02/04/vitimas-precisam-de-solucoes-rapidas-dizem-especialistas-em-saude-mental.htm
https://g1.globo.com/mg/centro-oeste/noticia/2019/02/07/rejeitos-de-lama-sao-encontrados-em-trecho-do-rio-paraopeba-em-maravilhas.ghtml
https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/01/26/policias-federal-e-civil-abrem-inqueritos-para-apurar-rompimento-de-barragem-da-vale.ghtml
https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2019/02/08/interna_gerais,1029081/iml-identifica-mais-17-corpos-e-numero-de-desaparecidos-cai-para-165.shtml
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